Os Mutantes, Rogério Duprat, Gilberto Gil, Gal Costa e Torquato Neto – o grupo, o maestro, o mentor-compositor, a intérprete e o poeta – são nomes que imediatamente vêem à lembrança quando se fala em Tropicalismo. Mas, além desses, quase nunca, ou muito pouco, é lembrado o grande instrumentista, sem o qual discos de Gil e Gal, especialmente, perderiam boa parte de sua mágica essência psicodélica.

O nome dele é Lanny Gordin ( (Xangai, China, 28 de novembro de 1951 – São Paulo, Brasil, 28 de novembro de 2023), o sujeito que fez passar pelas cordas de sua guitarra o som mais radical do movimento que agitou a segunda metade da década de sessenta. Sintonizado com os grandes mestres internacionais, especialmente Jimi Hendrix, ele divide o panteão nacional dos grandes do instrumento com Sérgio Dias, Mimi Lessa, Pepeu Gomes, Sérgio Hinds, Luiz Carlini, especialmente.

Gil ao vivo, em 1972, acompanhado pelo guitarrista Lanny Gordin

Um dos mais importantes guitarristas brasileiros, iniciou a carreira tocando na boate Stardust (de seu pai), em São Paulo, ao lado de Hermeto Paschoal. Estreiou em disco tocando com Eduardo Araújo, seu verdadeiro “descobridor”, na música “Nem Sim, Nem Não” (ouça abaixo), lançada em compacto, a quem também acompanhou no início dos anos setenta.

Em 1968, passou a integrar o grupo Kantikus, da ex-O’Seis, Suely Chagas, que contava com a participação do também guitarrista Rafael Vilardi, outro ex-integrante do sexteto pré-Mutantes. Junto com Vilardi, Lanny é responsável pelas ultra-psicodélicas guitarras do único compacto do grupo Suely e Os Kantikus, contendo “Que Bacana” (vencedora do Primeiro Festival Universitário de São Paulo, em 1968) e Esperanto.

Clássico compacto de Eduardo Araújo, destacando Lanny na guitarra

Em 1969, com Hermeto Paschoal e o também guitarrista Olmir “Alemão” Stockler, formou o super grupo Brazilian Octopus. Com ele gravou um único e raríssimo LP, trazendo uma das suas poucas composições – a música O Pássaro, que ganhou letra e foi regravada por Catalau, vocalista do grupo Golpe de Estado, em disco pelo selo Baratos & Afins, em meados dos anos noventa.

Mas foi com discos de Gilberto Gil, Gal Costa e Caetano Veloso, gravados entre 1969 e 1972, especialmente, que Lanny Gordin deixou a sua marca de criatividade no movimento tropicalista. No disco de Gilberto Gil de 1969 e no clássico Expresso 2222, Lanny e sua guitarra dá o colorido psicodélico, em músicas como Cérebro Eletrônico, A Voz do Vivo, 2001 e Back in Bahia. Nos primeiros discos de Gal Costa, atuando também como arranjador, em particular no clássico ao vivo Fa-Tal, ele também deixa clara a sua importância para o que se convencionou chamar de Tropicália.

Ainda, no “álbum branco” de Caetano Veloso (1969), outra vez Lanny imprime a sua marca psicodélica nos mais variados ritmos, com destaque para Atrás do Trio Elétrico, Marinheiro Só e Não Identificado. Outras grandes aparições de Lanny estão na música Irene, na versão de Tom Zé, ao lado do grupo paulista The Beatniks, e no primeiro disco de Jards Macalé, de 1972, onde toca baixo e violão.

Na década de sententa ainda formou o efêmero Lanny Trio e participou do disco Carlos, Erasmo, do Tremendão da Jovem Guarda, ao lado dos Mutantes, Arnaldo e Serginho, entre outros craques da época. . E ainda em discos de Tim Maia e outros artistas da MPB.

Anos depois, ressurgiu no início da década de oitenta com o grupo Aguilar e Banda Performática – que tinha entre seus integrantes o futuro Titãs, Paulo Miklos – com quem gravou um lp e participou de coletânea lançada pelo jornal O Pasquim. E, no final dos anos noventa, participou de shows em São Paulo ao lado de Snoopy, ex-baterista do grupo americano Love, clássico da psicodelia dos anos sessenta.

Apesar da pouca valorização de sua obra, do que faz parte a ausência de um CD-tributo com suas participações, Lanny Gordin deixou para sempre a marca de suas cordas de ácido, sem o qual o tropicalismo não seria o mesmo. Um gênio da guitarra, que ainda terá seu nome inscrito entre os grande instrumentistas da música brasileira moderna.

Documentário produzido por Luis Calanca / Baratos Afins

Discografia Solo:

Lanny Gordin
Projeto Alfa, volume I e II
Lanny duos

Participações e arranjos:

Eduardo Araújo & Os Bons – Nem Sim, Nem Não/Não Posso Dizer Adeus (Compacto, 1968)
De Kalafe & A Turma – Mundo Quadrado/Guerra (Compacto, 1968)
Suely & Os Kantikus – Esperanto/Que Bacana (Compacto, 1968)
Brazilian Octopus – Brazilian Octopus (LP, 1969)
Silvinha – Silvinha (LP, 1968)
Gilberto Gil – GG 1969 (LP/CD, 1969)Cetano Veloso – Caetano Veloso (LP/CD, 1969)
Gal Costa – Gal Costa (LP/CD, 1969)
Gal Costa – Gal Costa (LP/CD, 1969)
Gal Costa – Legal (LP/CD, 1970)
O Quarteto – O Quarteto (Phillips 1968)
Anamaria & Maurício – No No No … (lp, 1970)
Rita Lee – Build Up (LP/CD, 1970)
Erasmo Carlos – Carlos Erasmo (LP/CD, 1971)
Gal Costa – Fa-Tal, ao vivo (LP/CD, 1971)
Silvinha – Silvinha (LP, 1971)
Tim Maia – Chocolate/Paz (Compacto, 1971)
Tom Zé – Irene (Compacto, 1971)
Eduardo Araújo – Eduardo Araújo (LP, 1971)
Jards Macalé – Jards Macalé (LP/CD, 1972)
Gilberto Gil – Expresso 2222 (lp/cd, 1972)
Antonio Carlos & Jocafi – Mudei de Ideia (LP, 1971)
Fábio Antiero – Compartimento Etéreo (LP, 1981)
Aguilar & Banda Performática – Aguilar & Banda Performática (LP, 1982)
Catalau – Catalau (CD, 1997)
Jards Macalé – O Q Eu Faço é Música (CD, 1998)
Itamar Assumpção – Preto Brás (CD, 1998)
Vange Milliet – Vange Milliet (CD, 1995)

Foto: Reprodução.

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