Serrita-PE, sertão nordestino, nunca pareceu o tipo de lugar de onde surgiria um superstar pop. Até João Gomes aparecer com um celular na mão. Lá, onde a missa do vaqueiro ecoa tradição e fé, ele começou a cantar e a sonhar.

Há algo de profundamente brasileiro e profundamente contemporâneo em João Gomes. Ele é o tipo de artista que surge quando o país muda silenciosamente de endereço.

Sem alarde, sua música desloca o centro da cultura do asfalto cinzento do Sudeste para o barro quente do Nordeste (lembrando Chico Science & Nação Zumbi). A virada não vem por manifesto, mas por um menino de Serrita que canta como quem respira e posta como quem conversa.

Da terra que inspirou Luiz Gonzaga, João carrega não só a herança sertaneja, mas a fibra de quem cresceu sustentado pela trinca fé–humildade–disciplina, como canta em “Eu Tenho a Senha”.

João Gomes é um nativo da internet, como observou um amigo e jornalista argentino. Se Gonzaga tinha a estrada de chão, João tem o feed; se o velho mestre levou o sertão ao rádio, João leva o sertão ao algoritmo – como sugere Adelaide Ivanova em artigo para o Sesc São Paulo (leia aqui). 

Desse “diário de Serrita” nasceu seu sucesso explosivo: um artista antes da (“grande”) indústria, impulsionado pelo poder das redes. E projetado por estruturas regionais – Top Eventos (produtora) e Sua Música (plataforma digital)

Ele é o superstar que não precisou deixar o cheiro de café da avó, o teclado de vaquejada, o parceiro sanfoneiro, a fé que guia seus passos. Chegou ao mainstream sem passar pelo portal higienizador da indústria, foi a indústria que atravessou o portal de Serrita.

Hoje, funciona como um tradutor cultural. Toma o sertão de Serrita, o piseiro, o forró, as vaquejadas, o chapéu de couro, a fé, e apresenta tudo isso ao Brasil e além.

É, de muitas formas, um novo Luiz Gonzaga para a era digital. Não por repetir o passado, mas por reconstruí-lo com celular na mão, sem trair sua origem.

Mais do que um fenômeno da internet, João Gomes é prova de que o Brasil profundo continua falando alto pela sanfona, pelas canções e pelo coração de milhões.

Foto: Reprodução Instagram.

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